Mito abre calendário cultural do município
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Pedra do Rei Sabá, onde acredita-se que o rei esteve encantado |
Ele é o protetor da
ilha, o provedor de pescarias abundantes, mas também é conhecido pelos castigos
que impõe aqueles que ousam desrespeitar as leis da encantaria e a natureza
exuberante que cerca sua morada.
Narrativas
extraordinárias sobre esse ser encantado que povoa o imaginário dos
hospitaleiros pirabenses, mostram o quanto a presença mítica do “Rei Sabá” influencia
a cultura do município de São João de Pirabas. Pois na cidade não há quem nunca
tenha ouvido um “causo” de benevolência ou de castigo atribuído ao monarca, que
no dia 20 de janeiro recebe oferendas de pais, mães e filhos de santo de
diferentes ramificações do candomblé, da umbanda e da pajelança, vindos de
várias partes do país para conhecer a ilha de Fortaleza, o reino encantado de “El
Dom Sebastião”.
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Gravura de D.Sebastião, o desejado de Portugal |
Essa relação com o
monarca português, o último da dinastia de Aviz, morto na batalha de Alcácer-Quibir,
no Marrocos, em 1558 por conta de um confronto com os Mouros, é percebida por
vários estudiosos das religiões afro amazônidas, entre eles os antropólogos
Anaiza Vergulino e Heraldo Maués, que por meio de pesquisas orais confirmaram a
associação do “Rei Sabá” ao desejado herdeiro do trono lusitano. É importante
abrir esse parêntese porque na mesma data também é comemorado São Sebastião, o
mártir católico.
Nas celebrações que
acontecem em cima de um platô de pedras cenozoicas, no final da extensa faixa
de areia, na ilha da Fortaleza, conhecida como praia do Castelo, milhares de
pessoas se juntam aos religiosos para agradecer pelas graças alcançadas ou em
busca de algo ainda não realizado. Em meio aos rituais onde os sacerdotes
invocam e recebem suas entidades, nativos e turistas também aproveitam para buscar
aconselhamentos, meditar e depositar suas oferendas. Bebidas alcóolicas, velas,
bombons, flores, cestas com frutas entre outros objetos são os mais comuns.
 |
Estátua do caboclo Zé Raimundo também recebe oferendas |
Nesse local de beleza
típica do litoral paraense, ao pé de uma pequena montanha, além da pedra do
“Rei Sabá”, também foram erguidas mais quatro estátuas. Duas delas representam
a casa dos turcos encantados, Jarina e Mariana; Yemanjá e caboclo Zé Raimundo
completam o cenário místico, considerado um local sagrado para as religiões
afro amazônidas.
O monumento ao Rei
Sabá é uma pedra natural esculpida sobre um grande platô de rochas, que também
abriga um sítio paleontológico, local de onde foi retirado o fóssil de um
caramujo gigante, em 2009, descoberto por pesquisadores da Universidade Federal
do Pará. Até o final da década de noventa do século passado, a pedra tinha a
semelhança de um homem de costa para o mar, em posição de meditação, antes de
sofrer depredação ou a ação da própria natureza, o que ocasionou rachaduras na
pedra que precisou ser afixada em uma estrutura de concreto.
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Praia do Castelo, bens imateriais culturais e paleontológico |
Segundo
o historiador Gerson Santos, o culto às entidades da encantaria no local onde
está a pedra do “Rei Sabá” acontece desde o período do Brasil colonial. “Sempre houve cultos na pedra.
Há registro de João Francisco Lisboa, no período colonial, de celebrações onde
possivelmente seria a Pedra do rei Sabá”. Lisboa é como se diz na
literatura historiográfica, era um viajante. “Na verdade muitos historiadores usam essa literatura como documento
histórico, o que o torna mais uma fonte histórica do que um historiador” –
explicou o pesquisador que é natural do município.
As celebrações ao Rei Sabá acontecem
na ilha da Fortaleza durante o dia de acordo com o fluxo das marés. A saída das
embarcações se dá na vazante, por volta das 8h, enquanto que o retorno da ilha
está previsto para as 16h.
Aviso aos visitantes:
A travessia é feita em grande parte em
barcos de pesca, que saem principalmente do trapiche do mercado municipal e da rampa
da princomar, na orla do beiradão. O percurso dura em média 40 minutos. Por ser
um local rústico, o visitante deve se precaver com alimentação e água.