quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Entendendo nosso jeito de comemorar a virada do ano



Réveillon mistura tradições religiosas

Tradicional queima de fogos na torre da RBA, em Belém.

 
Da Europa vieram as luzes e a ceia cristã, que foram se misturando ao branco da umbanda e às defumações.
Pular sete ondas no mar, tomar banho de cheiro para atrair boas vibrações, defumar as casas, vestir-se de branco. Estes são alguns dos inúmeros hábitos que as pessoas costumam realizar para comemorar o Réveillon. Tradições advindas da mistura de culturas e religiões no Brasil, esses costumes povoam o imaginário da sociedade e fazem parte das comemorações na virada do ano em todos os estados do país. Professores da Universidade Federal do Pará (UFPA) explicam as origens e influências dessas manifestações. Segundo a antropóloga Marilu Campelo, o termo Réveillon vem do francês reveiller, e significa “uma refeição noturna”, adaptada às festas que já ocorriam em meados de 1885. Trata-se de uma invenção europeia, trazida para as demais sociedades e países ocidentais. “Entretanto, o hábito de comemorar a passagem do ano é bem mais antigo e varia de povo para povo, pois cada grupo tinha a sua contagem de tempo.” No Brasil é seguida a tradição católica iniciada a partir de 1582, adotada do calendário gregoriano. Este calendário foi inventado pelos romanos, os primeiros a fazer grande festa no fim de ano.
A pesquisadora afirma que usar roupas brancas na virada do ano é uma tradição proveniente da prática umbandista e teria iniciado com algumas pessoas que faziam oferendas nas praias cariocas e santistas para Iemanjá, uma das principais entidades da umbanda. “Depois, a mídia começou a reproduzir estas festas já inseridas em um gosto de classe, relacionando isso a outros significados que diferiam do sentimento afroreligioso. Acredito que a moda pegou a partir da popularização nas novelas e programas de TV, nos anos 80 e 90, portanto este é um hábito recente no país”, completa.

BOAS VIBRAÇÕES

Marilu Campelo esclarece que as defumações têm uma origem muito antiga e estão relacionadas à produção de alimentos, pois têm efeito bactericida, mas seu uso não é restrito às religiões afro-brasileiras. Na antiguidade, por exemplo, diversos povos utilizavam aromas e ervas para preparar as oferendas aos deuses, mas não se sabe ao certo quando os povos começaram a usar as plantas aromáticas. Para o antropólogo Romero Ximenes, defumar as casas no final do ano é um rito de purificação e limpeza do ambiente, praticado pela religião católica, pelo candomblé, pela umbanda e por outras manifestações religiosas, inclusive fora dos cultos. Segundo ele, na Amazônia defuma-se na pajelança indígena usando tabaco, breu-branco, priprioca, entre outras ervas. “No Pará é comum o uso de banhos e defumações na passagem do ano usando produtos de cultos afro. O breu-branco, especialmente perfumado e produtos de fumaça abundante é um destaque regional”, afirma Romero.
O pesquisador explica que os ritos e elementos simbólicos afro-brasileiros nem sempre são diferentes do catolicismo. Segundo ele, os africanos que vieram para o Brasil eram de várias etnias, línguas e culturas, algumas inclusive islamizadas. “Podemos afirmar que celebrar a passagem do ano seria rememorar as culturas de outros períodos. O mundo global é mestiçado ao extremo, o próprio cristianismo é uma formação histórica judaico-gregoromana.”
Segundo Marilu Campelo, o hábito de utilizar velas nas festas de dezembro é cristão e veio para o Brasil com o catolicismo trazido pela colonização portuguesa. Ela explica que nas regiões africanas onde existem cultos tradicionais mulçumanos ou não cristãos, não se usam velas. “A origem do uso de velas no natal está relacionada ao período entre os séculos XVI e XVIII. Nessa época as pessoas tinham o hábito de decorar as árvores com velas, que representavam a luz de Cristo; com estrelas, para simbolizar a estrela de Belém, que anunciou o nascimento de Jesus; e com rosas, em homenagem à Virgem Maria”.

ASCOM UFPA
Foto: Daniel Costa/Diário do Pará

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